Portal Vinícius Soares

Compartilhe

O nicho bilionário que muitas empresas ainda não enxergaram

A contratação com o setor público brasileiro está alicerçada em um dos mais robustos arcabouços normativos do mundo. A Lei nº 14.133/2021, que instituiu a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, representa um marco na modernização do sistema de contratações públicas, estabelecendo princípios e diretrizes que asseguram transparência, eficiência e isonomia

Dr. Renato Ewerton de Melo (*)

A economia brasileira movimenta anualmente centenas de bilhões de reais através de contratações públicas, configurando um dos maiores mercados do país. Paradoxalmente, grande parcela do empresariado nacional permanece alheia a essa realidade, perdendo oportunidades substanciais de crescimento e diversificação de receitas. Os números do primeiro semestre de 2025 são eloquentes: mais de 500 mil processos licitatórios foram registrados no país, evidenciando um mercado pujante e em constante expansão.

A dimensão econômica das contratações públicas:

O volume de processos licitatórios revela apenas a superfície de um fenômeno econômico de proporções continentais. Dos 500 mil processos registrados no primeiro semestre de 2025, aproximadamente 275 mil corresponderam a pregões, modalidade que se consolidou como o principal instrumento de contratação pública no Brasil. As dispensas de licitação, por sua vez, totalizaram cerca de 145 mil processos, representando um segmento menos explorado e, consequentemente, com menor concorrência direta.

Esses dados, disponibilizados pelo Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), demonstram que as contratações públicas não constituem mero apêndice da atividade econômica, mas sim um setor estruturante da economia nacional. A pulverização geográfica desses processos – abrangendo União, Estados, Distrito Federal e mais de 5.500 municípios – oferece oportunidades em todas as regiões do país, desde grandes centros urbanos até pequenas localidades do interior.

Segurança jurídica

A contratação com o setor público brasileiro está alicerçada em um dos mais robustos arcabouços normativos do mundo. A Lei nº 14.133/2021, que instituiu a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, representa um marco na modernização do sistema de contratações públicas, estabelecendo princípios e diretrizes que asseguram transparência, eficiência e isonomia.

O novo diploma legal introduziu inovações significativas que fortalecem a segurança jurídica das contratações. A obrigatoriedade de divulgação centralizada dos atos licitatórios no PNCP eliminou a dispersão informacional que caracterizava o sistema anterior, criando um ambiente de maior previsibilidade e controle. A padronização de procedimentos e a definição clara de competências reduzem substancialmente os riscos de questionamentos e impugnações.

Complementarmente, a Lei Complementar nº 131/2009 – Lei da Transparência – estabelece a obrigatoriedade de divulgação dos gastos públicos em tempo real, criando um sistema de accountability que beneficia tanto a administração quanto os contratados. Essa transparência compulsória funciona como mecanismo de proteção mútua, reduzindo riscos de interpretações equivocadas e fortalecendo a legitimidade das contratações.

A moderna legislação brasileira

A legislação brasileira de licitações experimentou, nas últimas décadas, um processo de modernização que a posiciona entre as mais avançadas do mundo. A Lei nº 14.133/2021 não apenas consolidou décadas de jurisprudência e doutrina, mas também incorporou as melhores práticas internacionais de contratação pública.

A introdução de institutos como o diálogo competitivo, o procedimento de manifestação de interesse e a contratação integrada demonstra a capacidade do legislador brasileiro de adaptar-se às demandas contemporâneas da administração pública. A ênfase na sustentabilidade, na inovação e na economicidade reflete uma visão estratégica que transcende a mera aquisição de bens e serviços, buscando a otimização de recursos e a geração de valor público.

O sistema de registro de preços, aperfeiçoado pela nova legislação, oferece às empresas a possibilidade de contratos de longo prazo com demanda garantida, proporcionando previsibilidade de receitas e facilitando o planejamento empresarial. A ampliação das hipóteses de contratação direta, quando devidamente justificadas, agiliza processos e reduz custos transacionais para ambas as partes.

O nicho inexplorado

Apesar da magnitude do mercado de contratações públicas, observa-se uma participação desproporcional de empresas especializadas, deixando vastos segmentos subexplorados. Setores como tecnologia da informação, consultoria especializada, serviços ambientais e soluções de infraestrutura apresentam demanda crescente e concorrência relativamente baixa.

A descentralização administrativa brasileira multiplica as oportunidades de contratação. Enquanto grandes empresas concentram-se nas licitações federais de maior valor, milhares de processos estaduais e municipais permanecem com participação reduzida, oferecendo margens mais atrativas e relacionamentos comerciais duradouros.

A modalidade de dispensa de licitação, responsável por 145 mil processos no primeiro semestre de 2025, representa um nicho particularmente interessante. Essas contratações, embora de menor valor individual, oferecem agilidade processual e menor concorrência, sendo ideais para empresas que buscam diversificar seu portfólio sem grandes investimentos em estrutura comercial.

Considerações estratégicas para as empresas

O mercado de licitações públicas não deve ser encarado como alternativa emergencial ou complementar, mas como componente estratégico do planejamento empresarial. A estabilidade dos pagamentos, a previsibilidade da demanda e a segurança jurídica das contratações oferecem vantagens competitivas significativas em cenários de instabilidade econômica.

A participação em licitações públicas exige, naturalmente, adaptação organizacional e conhecimento especializado. Contudo, os investimentos necessários são amplamente compensados pela magnitude e estabilidade do mercado. A modernização legislativa e a digitalização dos processos reduziram substancialmente as barreiras de entrada, democratizando o acesso a esse mercado.

O empresariado brasileiro que permanecer alheio às oportunidades das contratações públicas estará negligenciando um dos maiores e mais estáveis mercados do país. Em um ambiente econômico caracterizado pela volatilidade e incerteza, as licitações públicas representam uma âncora de estabilidade e crescimento que merece consideração estratégica prioritária.

Fontes:

Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP) – Dados do primeiro semestre de 2025
Lei nº 14.133/2021 – Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos
Lei Complementar nº 131/2009 – Lei da Transparência
Licitacaonet – Panorama das Licitações no 1º Semestre de 2025

COMPARTILHE